Health/Wellness Coaching – nem tudo o que luz é ouro !

Gosto de recordar o boom da ginástica aeróbica nos anos 80, de refletir sobre como era ministrada nos ginásios de Portugal. Até surgirem na década de 90 os primeiros cursos de certificação de “instrutor fitness”, fazíamos master-classes com estrangeiros e saltávamos em cima de tatamis com sapatilhas de ginástica. Qualquer curioso com algum sentido rítmico, resistência física e coordenação poderia “agarrar” uma aula.

Chegou depois a tendência PT, uma oportunidade profissional para muitos “instrutores” transferirem o seu know-how numa base individual. Esta foi uma lufada de ar fresco, não só como fonte de rendimentos extra para ginásios, mas sobretudo como possibilidade de alongar a profissão por mais anos, encontrar uma especialização ou desenvolver um nicho. E aqui se repete um ciclo, a formação (ou a necessidade dela) veio depois do movimento se ter empregnado no mercado.

Como era previsível e necessário à evolução e às exigências desta indústria, assistimos à emergência do Fitness /Wellness Coaching. Á semelhança de outros países desenvolvidos, também nós, instrutores, fomos contaminados pelo poder desta abordagem e pelo potencial que acrescenta às relações profissionais.

Prática corrente no mundo anglo-saxónico desde os anos 80, focada na vertente Life, Business e Executive. Assenta em Portugal[1] a nível Corporativo e de Negócios – Business Coaching (44,1%) e de Coaching de Vida – Life Coaching (38,2%).

Comecei a pesquisar em 2007, aquilo que viria a ser o Wellness Coaching português. Sigo o trabalho de organizações de renome internacional nesta matéria, bem como o aparecimento de formação específica por entidades ligadas ao fitness e não só. O fascínio mantêm-se desde então.

A eficácia do processo é inquestionável quando devidamente gerido. Os benefícios são diversos e sobretudo ligados à construção da autoeficácia – a perceção de que o coachee (cliente) detem os recursos para superar os desafios de mudança comportamental ao nível do estilo de vida.

Multiplicam-se agora os sites de novos Coaches e, nos health clubs, as iniciativas de angariação para este “novo serviço”. De tudo podemos encontrar por baixo deste chapeú, de suplementação a “massagens holísticas”, passando pelos “treinos de bem+estar” !? E mais uma vez, a qualificação técnica é algo duvidosa. Não podemos deixar de manifestar alguma preocupação ao verificar que corremos o risco de converter uma prática de excelência num exercício de simpáticos curiosos que acabaram de descobrir a pólvora num retiro de fim-de-semana.

Passo o desabafo, mas não havendo a devida regulamentação, à semelhança do papel do IDP e das cédulas Procafd para o domínio das atividades físicas e desportivas, qualquer pessoa se pode, hoje, intitular de Coach.

Por muito que se perceba de exercício físico e de prescrição e se acumulem certificados nesta matéria, por excelente técnico e motivador que se possa ser, a ligação a excelente Coach não é nem direta nem linear.

Apesar de já não saltarmos em tatamis e usarmos ténis de última geração, passou a ser preciso investir noutro tipo de competências, de ordem técnica (e não falamos de execução física), emocional e relacional.

A relação de Coaching é de promoção de desenvolvimento do outro, até aí semelhante à de um Instrutor ou Personal Trainer. Contudo, a eficácia do processo passa pela profundidade de consciência e nível de reflexão que se consegue gerar no cliente, mediada por um registo predominantemente verbal que pode facilmente enveredar para situações relacionais intensas, complexas e confidenciais para as quais o Coach deverá estar devidamente preparado.

Vejamos juntos o que é de facto a profissão de fitness/health/wellness Coach, e que condições são essenciais à sua prática.

Formação, conhecimento, competência consciente e responsabilidade andam aqui de braço dado. Neste contexto, o Fitness/Health/Wellness Coach é um novo profissional, agente facilitador de transformação num processo em que as pessoas assumem os novos cuidados, mantêm hábitos saudáveis e desenvolvem autoeficácia para viver em equilíbrio, plenitude e bem+estar.

A mudança de paradigma trazida pelo Coaching consta basicamente em deixar de vender os benefícios dos bons comportamentos, e procurar as perspetivas do cliente sobre benefícios pessoais. As pessoas são mais persuadidas pelas suas próprias palavras dos que pelas dos técnicos, por isso a maior parte resiste ou desiste de serem mudadas pelos outros. As interações relacionadas com o modelo médico de prescrição a que estamos acostumados, focam-se nos números – kgs e cms, e nos problemas – pressão arterial, LDL, excesso de peso, etc. com pouco tempo dedicado à construção de uma dinâmica relacional que promova um sentido de significado na tarefa, alinhado com as crenças e os valores do indivíduo.

Ser Fitness/Health/Wellness Coach vai muito para além das técnicas de PNL, de relacionamento interpessoal e de aconselhamento sobre como aumentar (ou treinar para) o seu bem-estar. Somos caçadores de forças e virtudes à procura de competências e capacidades no meio do ruído. Vemos desafio em vez de resistência; prudência em vez de relutância; desejos por alcançar em vez de frustração. Para isso, o Instrutor, habituado a ser o centro da atenção, deve mudar de plano, descer do palco, onde prescreve e recomenda, deve sentar se ao lado do cliente e devolver-lhe o protagonismo, deixá-lo assumir o controlo, por entre técnicas e ferramentas próprias. E esta mudança de plano deve ser aprendida.

Desta forma, há vários investimentos a fazer que passam pelo desenvolvimento de competências pessoais através de:

  • uma certificação reconhecida, numa escola com provas dadas, garantia de permanência, de acompanhamento profissional e um código de conduta ou ética definido.

A experiência e os resultados comprovam que as certificações específicas em Coaching podem fazer a diferença, facilitando não só a regulação do mercado, como a garantia de qualidade de serviço – para que não seja vendido “gato por lebre”. Nenhuma universidade nacional fornece ainda um diploma profissional de Coaching e as formações existentes emanam fundamentos e práticas variadas. O trabalho de diversas associações de Coaching permitiu o acesso e a circulação de informação. A International Coach Federation (ICF) partilha numa base regular as suas pesquisas no desenvolvimento de standards de excelência para certificações, formação contínua e prática em Coaching. A International Coaching Council, a International School of Professional Coaching são outros exemplos de instituições relevantes.

  • desenvolvimento pessoal contínuo, Mudar de hábitos pode ser avassalador. Facilitar a mudança dos outros também. O investimento em auto-conhecimento terá um valor inestimável na prática de Coaching e assenta na pedra-angular da maiêutica de Sócrates “Conhece-te a ti mesmo”. Poderá passar por vivenciar um processo de coaching (preferencial), por procurar ações de abordagem humanista, Gestalt, análise Transacional, Psicologia Positiva, entre outros.
  • supervisão proporcionada por um mentor Coach. Uma prática consciente e responsável deve ser, pelo menos numa fase inicial, acompanhada por quem fez e sabe mais.
  • participação em grupos de discussão e de formação contínua proporcionados pelas redes sociais e por organizações/associações profissionais. Existem em Portugal algumas organizações que procuram definir campos reguladores da prática como o núcleo de formadores e coaches da APG, a APROCEP, o Portuguese Coaching Group e o ICF Portuguese Chapter que “ existe para Construir, Apoiar e Preservar a integridade da profissão de Coach (…).”

Tal como um bom Instrutor/ Personal Trainer seguirá as recomendações da ACSM e de outras organizações na prescrição do treino, é recomendável que um bom Coach guie a sua prática segundo guidelines definidas por alguma organização internacional credível. A escolha da(s) entidade(s) a seguir passa pelas garantias que oferece(m) ao nível dos anos de existência e experiência no mercado, do numero de membros associados, dos coaches formados e da credibilidade junto da comunidade que serve.

No domínio do health/wellness coaching, existem a nível internacional, dúzias de escolas e programas de formação que treinaram nos últimos 10 anos mais de 20000 coaches profissionais em Fitness/Health/Wellness Coaching. Destacamos a Wellcoaches Foundation criada em 2001, agora em estreita colaboração com o American College of Sports Medicine e com a Harvard Medicine School, a RealBalance com a sua certificação acreditada ACSTH pela ICF e a importância do National Wellness Institute na definição do construto de wellness e no contributo para a sua investigação.

Escolher um Coach

A reputação e a credibilidade de um Coach devem ser defendidas por referências, testemunhos, case studys bem como formações e certificações concluídas. É conveniente uma entrevista exaustiva para determinar a relevância da experiência profissional para a relação de coaching futura. O pretendente a Coach deverá também demonstrar outras qualidades, relacionadas com profissionalismo, paixão, confiança e humildade.

Um potencial Coachee deverá entrevistar diversos Coaches para verificar os aspetos anteriores e tomar uma decisão. Um Coach credível não terá problemas em oferecer uma sessão de avaliação. Os outros também não!

be well, be more


[1] investigação levada a cabo por Barosa-Pereira (2006), no âmbito da tese de Mestrado em Psicologia do Desenvolvimento Profissional da Universidade de Évora

Artigo Ideafit